Mãos ao ar

Blogue de discussão desportiva. Qualquer semelhança entre este blogue e uma fonte de informação credível é pura coincidência e não foi minimamente prevista pelos seus autores. Desde já nos penitenciamos se, acidentalmente, relatarmos uma informação com um fundo de verdade. Não era, nem é, nossa intenção.

quinta-feira, novembro 30, 2006

Os Merdinhas – Parte 3

Em miúdo, tive uma camisola do Jorge Cadete. Era a número 11, pintalgada com um tom de verde esbatido como uma alface, e trazia estampado o logótipo dos Seguros Bonança. Na minha inocência, eu venerava aquela camisola como o bem mais precioso do mundo.
Ora, o Joca Cadete tinha uma característica que o tornava absolutamente único na I Divisão portuguesa: ele falhava muitos golos nos grandes jogos. E também falhava muitos golos nos pequenos jogos. Com o Joca, os sportinguistas sabiam com que contar: dez golos falhados e, se Deus ajudasse, um golito marcado. Ah, mas que golo seria, senhores! Não propriamente pela jogada ou gesto técnico – o único gesto técnico que o Cadete parecia dominar com à-vontade era a respiração nasal. Mas o Cadete festejava os golos com uma energia contagiante: corria para os fotógrafos, os dois braços levantados, um esgar de gozo estampado no rosto. Clic, clic. As primeiras páginas do dia seguinte transbordavam de Jorge Cadete. O Cadete era, para os jornais desportivos, o mesmo que o José Castelo-Branco é hoje para a imprensa cor de rosa: irresistível.
Os mais novos já não se lembrarão do Joca. Ajudá-los-á saber que ele era uma espécie de Hélder Postiga, mas sem tirar golos de dentro da baliza. O Cadete seria provavelmente o resultado de um possível cruzamento entre o pai do Pauleta e a mãe do Nuno Gomes. Noto, em jeito de parênteses, que o uso da palavra “cruzamento” adquire particular propriedade tratando-se de avançados.
Contra todas as evidências, eu gostava do Joca. O Joca tinha praticamente todos os atributos de uma estrela da bola: tinha uma melena particularmente fotogénica; era casado com uma menina que, fossem outros os tempos, e teria sido capa de uma qualquer FHM (hoje, em contrapartida, a Rita conseguiria apenas ser capa do suplemento “Cargas & Transportes” do jornal “Público”); tinha o melhor carro do parque automóvel do clube; e auferia um dos melhores ordenados. Só não sabia jogar à bola, defeito que, mesmo não sendo impeditivo, aborrecia um bocadinho.
Creio que o segredo do Joca era a sua tremenda disponibilidade para os media. Nunca conheci aliás ninguém mais disponível: o Joca falava sempre. Quando tinha coisas para dizer, mas também quando nada lhe ocorria à atormentada mente. Ficou aliás célebre a sua troca de palavras com o repórter da RTP, depois de um Portugal-5 Escócia-0.

Repórter: Cadete. Marcou dois golos. Gostou mais do golo de cabeça ou do golo que marcou com o pé esquerdo?
Cadete: Sim.
Repórter: Ahem… O público do Estádio da Luz assobiou-o, apesar de hoje representar Portugal e não o Sporting. Sai magoado?
Cadete: Não. Levei uma pancada no pé esquerdo, mas já quase não me dói.

Os jornalistas, claro, gente prática e com os mesmos escrúpulos com que Deus Nosso Senhor agraciou os bichos de conta, colocavam-no nos píncaros. E o Cadete foi ficando pelo Sporting.
Um dia, Carlos Queiroz chegou a Alvalade. É certo que fora Queiroz quem concedera a primeira internacionalização ao avançado do Sporting, mas o antigo seleccionador preferiu sempre o Domingos ao Joca na selecção. Para os mais novos terem noção, o Domingos seria qualquer coisa como o resultado de um cruzamento entre o pai e a mãe do Nuno Gomes.
Cavou-se abruptamente a sepultura do Joca em Alvalade. A contragosto, ele partiu para Brescia. Depois para Glasgow. E para Vigo. Um dia, chegou ao Benfica e, contra todas as expectativas, marcou um golo em Alvalade na única oportunidade de que dispôs.
Os tempos no estrangeiro tinham estragado o Joca para sempre!

quarta-feira, novembro 29, 2006

Os Merdinhas - Parte 2

Ao contrário do Bulhão Pato, não venho escarnecer nem destilar ódio para com um jogador que passou do Sporting para o vizinho da segunda circular. Pelo contrário, o jogador em causa teve uma atitude altruísta e que, parecendo uma grande contradição, acabou por demonstrar um profundo amor à camisola verde e branca.
Não, não me refiro ao Marinho, o lateral direito que Queiroz adaptou à inovadora e revolucionária posição de “pau para toda a obra”, embora este também tenha prestado um bom contributo à causa leonina – a contar pelo número de jogos que fez pelos encarnados e respectivas exibições paupérrimas.
O jogador a que me refiro dá pelo nome de Porfírio. Lembram-se? Foi um jogador nado e criado em Alvalade, que somou uns quantos títulos ao longo da sua evolução na “cantera” sportinguista e que, na fase acabou por assomar no plantel principal pela mão, se não estou em erro, de Bobby Robson. Porfírio era franzino mas raçudo, com tanto de mau feitio como de pêlo na venta, mas, gabe-se o engenho, dono de um pé esquerdo que fazia furor. Robson apostou nele ao convocá-lo para o estágio de pré-época na Holanda, em Doorwerth, mas Porfírio destacou-se logo no voo de Lisboa para o aeroporto do Schipol – refugiou-se na parte de trás do avião, camuflado entre outros passageiros, passando as duas horas e meia de viagem a consumir desenfreadamente o maço de SG Gigante – era ainda nos tempos em que havia um espaço reservado para fumadores.
Pois bem, Porfírio manteve-se durante uns tempos no Sporting, oscilando entre a titularidade, o banco de suplentes e a bancada, independentemente dos treinadores que com ele lidaram. Dele, sempre se disse que era um predestinado, um jovem valor e uma promessa. Mas o jovem tinha dois pequenos problemas: a competitividade nessa equipa do Sporting, formada por jogadores de qualidade assinalável, e o problema de “cabecinha”, que era um atributo muito pouco desenvolvido em Porfírio – era doido. Um doido saudável, é verdade, mas não menos doido.
Depois da estagnação no Sporting, veio-lhe uma crise de completa doidice: incompatibilizou-se com o clube e assinou pelos encarnados. Foi recebido na Luz como um herói, como um trofeu resgatado no covil do leão, e surpreendeu-me, admito, quando o vi envergar a camisola da águia com um sorriso de orelha a orelha. Só algum tempo depois percebi aquele sorriso. Porfírio assinara um contrato chorudo, mas a vontade de jogar era nula. Andou pela Luz aos pontapés no esférico até que, para variar, incompatibilizou-se. Com o clube, com os colegas, com os dirigentes. E até com a bola.
Num ápice, ficou a treinar com a equipa B, depois com os juniores e, de seguida, sozinho, às 7 da manhã. Mas vivia feliz: não jogava naquela equipa ranhosa – como ele próprio a definiu – e ainda arrecadava 15 mil contos no final de cada mês. Foi feliz na Luz durante vários anos até que, cansado, lá conseguiu chegar a entendimento para rescindir o contrato. E ainda recebeu uma indemnização.
Não sei o que é feito dele, mas proponho que o ponto alto da sua carreira seja a atribuição do prémio Stromp. Por dedicação à causa leonina, Hugo Porfírio bem o merece.

terça-feira, novembro 28, 2006

Os Merdinhas – Parte 1

Iniciamos hoje, em semana de clássico, uma série de crónicas dedicadas aos artistas que, tendo tido a graça de vestir de verde e branco, se desgraçaram e representaram posteriormente o Benfica. Fazemo-lo, recordando o histórico e pungente apelo do visconde de Alvalade que os historiadores perfidamente obliteraram dos livros de história: “Quero fazer deste clube um dos melhores da Europa, e os celerados que nos trocarem para jogar pelo taberneiro do Cosme Damião serão tratados como javardos que são. Um grande bem-haja”.

O Merdinhas
Um relato destes, que se pretende sério e imparcial como é norma da casa, só poderia começar pelo Merdinhas. O Merdinhas é, já o adivinharam, o petit nom de Simão, um dos melhores marcadores de penalties da nossa liga. Antecipo-me aos críticos: nada me move contra o liliputiano Simão, excepto talvez esta vontade incontrolável de o esganar, esmagando-lhe a jugular com o anelar esquerdo, enquanto os olhos dele reviram como os de um impala sufocado por uma leoa, com uma força, com uma força, com uma força que ninguém pode parar, com uma fome que ninguém pode matar, toma os comprimidos, Bulhão, que estás outra vez a hiperventilar. Puf puf puf.
Prossigamos.
Do vasto património cultural legado pelo Merdinhas, exalto duas histórias, reveladoras da rectidão de carácter do personagem. Lembram-se do golo de penalty no Mundial? O jogo não contava para nada, Portugal já estava a ganhar , o Merdinhas marcou o penalty e… ninguém o foi abraçar. Ora, o Merdinhas que já se ressente de não ser a primeira figura da selecção (era o Figo, agora é o Ronaldo, e o Quaresma, e o Nani, e o Carvalho, e o Gomes, e o senhor que corta a relva do Estádio do Jamor, e por aí adiante, antes de chegar a ele), não encaixou bem o golpe. Será porque sou pequenino? Ou porque ainda guardo no rosto o muco acumulado a guardar vacas, lá em Constantim.? Fosse pelo que fosse, o Merdinhas festejou sozinho. Ele bem chamava os colegas, os bracinhos muito irrequietos agitando-se freneticamente como uma marioneta, mas ninguém lhe ligou. Hom’essa! Se isto são umas bestas, hein! Quando chegar a Lisboa, eu compro um carro ainda maior e já lhes mostro.
Segundo episódio: no ano passado, depois de perder em Guimarães, um texto publicado no site do Merdinhas exonerava-o milagrosamente do descalabro. “Simão correu, mas ninguém acompanhou. Simão passou, mas ninguém passou. Simão rematou, mas ninguém se precipitou para a recarga”. O gesto, fino, caiu bem no goto de colegas e adeptos: tem bons fundos, o pequeno Smeagol. O génio em debute que todos vaticinaram lá teve o seu merecido lanche de palha no final da época, cozinhado pelos colegas despeitados e pelo público que lhe leu a pinta: ficou sozinho, o pobre. depois da aventura de Valência, ridicularizado nos jornais e humilhado no notário. Escreve agora novo comentário, imbecil! – riu-se o grupo dos trolhas que, prostrado diante do Estádio, discutia o preço das couves e o número de ventres perfurados com facas de ponta, durante a semana.
Poderia enumerar outros méritos: as letras garrafais da Sacoor estampadas na roupa, pretenso efeito de óptica para parecer maior; as rábulas da braçadeira de capitão; a inesquecível transferência para Liverpool; os calotes de que foi alvo. Mas não o farei. A culpa é, de certa forma, nossa. Como muito bem disse Manolo Vidal, falhámos qualquer coisa na formação do Merdinhas.

domingo, novembro 26, 2006

Dois canais codificados, pagos, só de desporto...

e, à hora do Manchester-Chelsea, a SporTV 1 transmite andebol e a SporTV 2 emite o sempre fascinante Junqueira-Benfica, em futsal.
Ná... Vale a pena assinar isto.

quarta-feira, novembro 22, 2006

Ó Bento, Usa o Que For Preciso



Daqui a umas horas, esquecemo-nos do Veiga e do João Pinto, dos penalties que o Bruno Paixão insiste em marcar, do bigode do Luís Filipe Vieira, dos dinamarqueses que pareciam deslocados do seu habitat natural [uma quinta, com patos, galinhas e perus], dos Apitos Dourados, dos chulos que gamaram sucessivamente a SAD do Sporting e do Tello que insiste em jogar benzinho quando eu já lhe li a sina.
Daqui a umas horas, só conta a bola em Milão. Força, rapaziada.

segunda-feira, novembro 20, 2006

Maldade



(Lusa, 20/11) O ex-director desportivo do clube com mais sócios do mundo, de acordo com a contabilidade da cerveja Guiness, foi hoje detido pelo DIAP. O Benfica inscreve assim o seu nome pela segunda vez na mesma semana no livro dos recordes, como a instituição desportiva que mais animados diálogos manteve com a justiça.
Escoltado por dois agentes, José Veiga teve ainda tempo para descansar a esposa:
- Olha, filha, eu volto já. Entretém-te a ver a televisão… Espera, foi arrestada.… Vai cozinhar qualquer coisa para acalmar… Hum, já não há fogão… Serve-te de qualquer coisa gelada no frigorífico… Humpf… Olha, pensando melhor, mira fixamente o tecto e conta os veios de tinta da sala, está bem?
Eu volto já.

Bem a propósito, recomendo leitura complementar: Aqui.

quinta-feira, novembro 16, 2006

O Estranho Caso dos Relógios

Este história foi-me contada por um amigo meu que é jornalista, e já tem alguns aninhos. Infelizmente, comprometi-me a não revelar nomes e, por isso, os indivíduos aqui referidos obedecem a iniciais: V.B., F.C. e L.F. O único que estou autorizado a esclarecer é o J, de jornalista, o tal meu amigo, mas possa dar pistas em relação aos outros protagonistas: o primeiro é tido no meio como o melhor guarda-redes português de todos os tempos e até da galáxia, o segundo é um central que se destacava pela farta cabeleira e por dar pau em tudo o que mexia e o último é reconhecido como o jogador mais internacional de sempre. E mais não posso dizer.
Na altura, estes três jogadores alinhavam no clube mais representativo de uma região do país vizinho que faz fronteira com França e que possui uma língua própria. É um colosso mundial e equipa de grená e azul mas, lamentavelmente, não posso dizer o nome. Pois bem, J teve uma ideia brilhante – juntava os três, entrevistava-os e, no fim, eram fotografados vestidos com fatos de mosqueteiros previamente alugados. O título da entrevista, J já tinha imaginado, seria “Os três mosqueteiros do XYZ” (o nome do tal clube).
J telefonou a L.F., com quem tinha mais confiança e lançou o repto. L.F. achou giro e J pediu-lhe “Pá, podes explicar aos outros e ver se eles também alinham?” Dois dias depois, recebeu a confirmação: “Pá, por eles tudo bem”. Foram feitas as diligências e aproveitando um estágio da selecção nacional no Porto, combinou-se a entrevista. J foi à Invicta, chegou ao hotel da selecção, encontrou L.F e disse que estava tudo pronto. Este assentiu com a cabeça e pediu para ficar para depois do almoço. Ok. J pediu que o hotel cedesse uma sala para se tirar a fotografia, montou um estúdio improvisado, alinhou os fatos de mosqueteiro todos engomados e ficou à espera. Passada uma hora, os jogadores desceram para o átrio do hotel onde J os aguardava. E travou-se o seguinte diálogo:
J – Então, vamos tirar a foto? Já tenho tudo preparado!
L.F. – Pá, não é bem assim, estive a falar com o V.B e com o F.C. e eles têm algumas propostas...
F.C. – Pois, temos umas propostas a fazer.
V.B – Repara numa coisa: tu tiras a foto, pões no jornal e, connosco vestidos à mosqueteiro, vais vender à brava. E nós, o que ganhamos com isso? Nada, não é?
J – Mas isso está implícito: nós damos uma capa com vocês e vendemos, mas vocês também têm publicidade gratuita e tornam-se mais populares. Sempre foi assim, a imprensa precisa de vocês, da mesma forma que vocês são divulgados por nós.
L.F. – Huuuum…
F.C. Pois…
V.B. – Isso é que era bom! Não precisamos da imprensa para nada, eu já sou super conhecido. É assim: se queres a entrevista e as fotos, queremos ser recompensados!
J – Recompensados? Com quê?
V.B. – Eh pá, nada de especial, apenas uma ofertazita.
J ligou para a redacção, falou com o director, este falou com a administrador. Depois de desligar o telemóvel, J disse-lhes:
- Bom, o administrador concordou em oferecer aos três, e respectivas acompanhantes, um fim-de-semana na neve, em Andorra, com tudo pago.
L.F. – Parece-me bem.
F.C. – Na neve é capaz de ser giro.
V.B. – Na neve?! Eu cá nem gosto de frio… Além disso, qual é o interesse? A cidade onde vivemos é pertíssimo de Andorra. Não, por mim, não!
J – Então não sei, se calhar o melhor é esquecermos…
V.B. – Repara, nós só queremos uma recordação, uma coisa simbólica.
J – Como por exemplo?
V.B. – Pá, um Rolex, por exemplo.
J – Um Rolex?!?!
V.B. – Sim, mas não é preciso ser daqueles de ouro e diamantes, basta um dos mais simples, para oferecermos às nossas mulheres! Não é preciso gastar mais que 300 ou 400 contos em cada um…
J retirou-se de cena. Desistiu da ideia. Voltou para Lisboa cabisbaixo, triste por não ter conseguido o “furo” jornalístico.
Nesse mesmo ano, V.B., depois de um jogo agonizante em que sofreu quatro golos de um clube da capital espanhola (que não posso revelar, mas que equipa às listas vermelhas e brancas e calções azuis), foi relegado para o banco de suplentes, de onde nunca mais saiu – excepto para a bancada, quando nem convocado era. A titularidade foi entregue a um holandês (não posso divulgar, mas começa em H, termina em P e tem um E e um S no meio). F.C. foi oscilando na equipa até ser vendido para outro clube e L.F. manteve-se em grande.
Hoje, V.B. continua no banco de outra equipa, onde os jogadores vêm ter com ele sempre que marcam um golo (será para lhe darem um Rolex?), F.C. arrasta-se por uma liga estrangeira e L.F. tornou-se num dos melhores jogadores do mundo.
J mudou de profissão.

Leio n'A Bola…

«Jordão parou em Janeiro de 1989, ainda Ronaldo estava a seis anos de nascer…»

Donde se infere que o prodígio da selecção conta agora com 11 precoces anos. Será que a Merche sabia?

Segue uma calculadora para a Travessa da Queimada.

terça-feira, novembro 14, 2006

Dos Professores e dos ex-Jogadores

Há um debate muito curioso nas profundezas das bancadas dos nossos estádios. Como todas as polémicas realmente nobres, chega em surdina aos jornais, subvertida em nome do célebre contraditório. Mas é entre os adeptos que o monstro ganha forma e se torna agressivo, susceptível de gerar uma boa cena de pancadaria se tivermos a sorte de juntar na discussão dois pólos de carga oposta.
Em linhas gerais, a controvérsia esgrime-se em torno das aptidões para treinar equipas de futebol – de um lado, movem-se os puristas, mais conservadores, que defendem a inegociável necessidade de recorrer a ex-jogadores para a função. Do outro, emergem os liberais, apóstolos da formação científica. Estes advogam a urgência de recrutar profissionais formados nas faculdades e calejados na arte da metodologia do treino e do treino de rendimento.
Os leitores conhecem-me. Sou menino de fortes convicções, mas de escassa bagagem intelectual. Até há muito pouco tempo julgava que a Oikos era uma associação de suinicultores e não de solidariedade social. Sobre nível literário, estamos, portanto, conversados. Mas talvez na pobreza do espírito saloio resida algum elemento válido para o debate.
O primeiro elemento da discussão é, lamento reconhecê-lo, de foro olfactivo. Os puristas querem fazer crer que um treinador que não conheça o “cheiro do balneário” não pode ser bem sucedido. O cheiro do balneário, está bem de ver, é indefinível. É etéreo. Ou se tem ou não se tem. Confesso que já estive em muitos balneários, e afianço que alguns tinham de facto cheiros vigorosos, mas escapa-se-me a relação entre o nariz capaz de reconhecer o perfume genuíno do balneário e a competência técnica. Mas eu sou, repito, um leigo.
Segundo elemento argumentativo: a arte do pontapé. Os puristas não toleram que os Peseiros, os Pontes, os Castros e outros que tais não saibam armar um pontapé ao ângulo. Acrescentam que a incapacidade de domar a bola lhes reduz a margem de manobra no balneário, a capacidade de liderança. E ditam lei: quem nunca jogou à bola não pode absorver as manhas dos artistas, nem pode compreender as especificidades de um relvado enlameado, de um campo de galinhas como o Adelino Ribeiro Novo ou de um piso sintético como o Luzhni de Moscovo.
Terceiro e decisivo argumento: o falhanço estrondoso do professor dos professores, do vilão que abriu a porta de Tróia e permitiu a invasão dos letrados. Se Carlos Queiroz, com as condições que lhe deram, falhou em tudo o que remotamente teve relação com o futebol profissional, os restantes cairão com igual estardalhaço.
Pressente-se a alegria de cada vez que um Vítor Pontes, um Jesualdo ou um Luís Castro desce de divisão. Os professores falharam. Quando um Zé Peseiro sai do Sporting imolado pela turba, adivinha-se a efusão. Há todo um recalcamento social, feio, viciado, sofrido, que vem à tona: o professor, o licenciado, o “perito” sai manchado da experiência. O professor não presta. Pois se o homem até rematava de bico, queriam que o plantel o respeitasse?
Há, porém, uma espinha cravada na garganta dos anti-professores: chama-se Mourinho. Não se lhe conhece experiência decente de jogador. Queiroz ainda foi guarda-redes do Ferroviário de Manlhagalhene, ou coisa assim. Mourinho nem a sénior chegou. Não inspirou o cheiro de balneário. Não creio que consiga parar uma bola com o peito, até porque o livro de cheques, no bolso da camisa, dificulta a recepção da bola. E enquanto outros jogavam à bola, ele tirou o curso no ISEF.
Com um piparote retórico, os anti-professores defendem-se. Mourinho não é professor. Ele inspirou o cheiro de balneário acompanhando o pai, ele sim, jogador digno de registo. Cantam-lhe loas ao seu percurso no futebol de formação, como se o Zé de Setúbal pudesse ter sido um aspirante a Dasaev. E, pasme-se, descobriram que ele foi um aluno medíocre na Faculdade. Enquanto cábula, o agora treinador do Chelsea estaria a preparar gigantesco golpe simbólico na credibilidade do sistema de ensino universitário. Certo, certo…

P.S.: Não tenho, repito, opinião firme na matéria. Reconheço bons treinadores formados nos bancos da faculdades ou nos bancos de suplentes. Não creio porém que se possa traçar um círculo de giz, à maneira de Brecht, separando os bons dos maus. Agora, se alguém ousar aventar o Peseiro, o Queiroz, o Jesualdo, o Pontes ou o Castro para o Sporting, contem-me já entre os anti-professores. Mais não, obrigado.

quarta-feira, novembro 08, 2006

O Apagamento do Levezinho

No meu sector do estádio, há quem me chame vândalo. Nesta sociedade de aparências, um fulano escavaca a cadeira do marmanjo da frente num acesso de fúria e fica logo com rótulos. É verdade que me exalto um poucochinho, mas que atire a primeira pedra aquele que nunca assaltou uma área de serviço, semeando um rasto de violência e pânico à sua passagem, ceifando vidas e uma ocasional grade de cerveja, depois de uma derrota do Sporting.
Bem me parecia…
Uma das piores coisas que pode acontecer a um adepto é deixarem-no gritar sozinho. Se vinte pessoas insultarem colectivamente o árbitro, é reconfortante, é caloroso, é bonito. Se é só um que se exalta, é um maluquinho, um mal-educado. E eu estou farto que me toque sempre a mim.
Vem isto a propósito dos jornais e das suas campanhas. Eu acho que os jornais estão repletos de tramas obscuras, negociatas sujas, clubites agudas e doentes mentais incapacitados. E estou só a falar do “Record” de ontem.
A última pancada jornalística é a quebra de forma do Liedson. Descobriram agora que, com 2 golos em 9 jogos, ele está abaixo do “exigível”. Por surpreendente coincidência, o “exigível” foi estabelecido pelos próprios jornais.
Há alguns meses, os jornais estavam prontos a administrar a extrema unção ao Postiga, morto e enterrado para o futebol, mais descoordenado do que um lobotomizado pelo Egas Moniz. Há alguns anos, era o Beto Acosta, que estava tão velho como o Moniz Pereira. Na semana passada, escreveram que o Baía era um guarda-redes de topo. Como vêem, não há limites para as barbaridades desta gente.
O caso de Liedson é, porém, mais sombrio. Eu, que vejo cabalas em todas as esquinas, antecipo um gozo especial nos jornais portugueses perante este anunciado “ocaso”. Liedson, o “depenator”, cometeu o pecado original: marcou seis golos ao Benfica desde que chegou a Portugal. E isso, nesta terra de andaimes e betoneiras, vale uma aversão incontrolável de camadas consideráveis da população. É certo que são camadas que não interessam a ninguém – aquelas que, nas castas indianas, se chamam Intocáveis, não propriamente porque ninguém lhes PODE tocar, mas mais porque ninguém lhes QUER tocar!
Recordo que, no ano passado, à entrada para a 8.ª jornada, o goleador do Sporting tinha marcado três golos. É, de facto, uma diferença considerável para os actuais 2, que justifica preocupação. Sobretudo, porque o melhor marcador do Benfica tem neste altura… (deixem-me consultar as tabelas)… três golos. E o do FC Porto tem 5.
Pessoalmente, só lamentei a exibição do Liedson contra o Sp. Braga, ela sim, desgarrada e apagada. De resto, e fanatismos à parte, reconheço sempre a generosidade do esforço do brasileiro, que vai a todas, que cria oportunidades para os colegas, que ataca e defende como poucos. Já uma vez o escrevi: este coro regular das carpideiras exigindo o afastamento do Liedson é alimentado do exterior. Os sportinguistas responsáveis devem fazer orelhas moucas e confiar no brasileiro…
Já os sportinguistas irresponsáveis, podem seguir-me enquanto emboscamos o carro do director de “A Bola” e lhe lançamos fogo [ao carro, claro, não vão julgar que estou a incitar a insurreição!]
Agora, vejam lá, não me deixem outra vez sozinho!

Dez dias?

Pausa de dez dias para preparar o Portugal-Cazaquistão?
Quando defrontarmos a Bélgica, imagino que será preciso parar o campeonato por mês e meio, não?
E agora, o que é que se faz num fim de semana sem bola? Vou a um museu, não?

segunda-feira, novembro 06, 2006

Pouca Vergonha

Mais um jogo em dia de semana, às 19h15. Afinal, quem manda no Sporting? É este senhor?


Ou este?

(pergunta de retórica, claro)

quinta-feira, novembro 02, 2006



Eis que, de súbito, António Lobo Antunes se junta ao painel de colunistas do Mãos ao Ar. Tentámos evitá-lo, reconheço, mas o homem nem empurrado nos desamparou a loja. Não tivemos outro remédio que não dar-lhe papel e lápis e deixá-lo verter em prosa as agonias que lhe moem a existência… E nos moem a nossa.
Sem mais delongas, eis António Lobo Antunes em rigoroso exclusivo nacional.

Os Pobrezinhos
Toda a gente teve brinquedos em criança. (eu não). Eu tive piolhos de presente e raspas como alimento. Nunca tive quem me dissesse
— Meu rico menino
e, de cachopo, guardei apenas a lei da mucanga, a única ordem que um menino em Angola respeita. Na mucanga, velhos e novos sabem que viver ou morrer é determinado pela forma como saímos da ribitu ria’nzo, que é como os bantus chamam, em umbundo, à porta de casa.
(Eu nunca fui pululu), diáfano, transparente, como se diz em umbundo. Nem sei porque escrevo com tantos parênteses e quebras de texto. Gosto de pensar que, se eu comi amargamente as passas de uma infância espezinhada, sem poder deglutir uma pipoca em liberdade
- ó Menino, não comas a omulu antes de jantar.
essa cáfila de forrozeiros, encafifados, bundas-moles, espadas-de-ogum, que são os meus leitores, não terão o prazer de ler e perceber, perceber e ler, ler e ler e demais combinações semânticas. Que estes arranjos todos já me estão a deixar a curinga em água.
Pedem-me para falar de futebol
- Os estupores, grandes cabrões, cafundós de Judas, que não respeitam o Escritor, assim mesmo, com letra grande porque eu comi o pão que o diabo amassou. E o que ele não amassou eu também comi.
(já não me lembro se fechei a frase anterior com um ponto final.) O zumbido da zabumba no meu tímpano confunde-me, e estes zês todos seguidos, misturados com palavras que mais ninguém conhece, como bafafá e gangorra, impedem a concentração do mais rigoroso engenheiro aeronáutico.
Está claro que eu já não gosto de futebol. (O futebol hoje é uma merda, como quase tudo na vida). Sou do Benfica porque me pareceu melhor gostar de um clube que está decadente, decrépito, destrambelhado, derivado, desvairado, desencabeçado, decadista, declinante (já gastei a letra dê no teclado, grande porra, que me faz tanta falta) que se arrasta pela lama escura, viscosa e pútrida, que chafurda onde os porcos não ousar meter o bedelho,
- O feitiço que com a infância bebi, com ele irei a enterrar
por que diabo me lembrei deste provérbio nhaneca-humbe? Nem eu sei,
(- Ó filho, vai comprar uma cautela à Teresinha!)
Alguém tem um comprimido para dar ao António? Uma esmolinha, pulhas. Que o Benfica ontem ganhou e ainda fiquei mais bilioso, (adusto e baço). Um crila escolhe um clube de curumim, certo de que vai sofrer menorreias toda a vida, e depois
- Ó filho, vai lá, que a tabacaria fecha!
vê isto. Merda!

A COLABORAÇÃO DE ANTÓNIO LOBO ANTUNES COM O MÃOS AO AR TEM O ALTO PATROCÍNIO DE XANAX, O ANSIOLÍTICO DAS CELEBRIDADES. “COM XANAX, ESQUECE AS DISCORDÂNCIAS DA SINTAXE”

quarta-feira, novembro 01, 2006

Mesmo assim


Eh pá. Eu sei que amanhã, dia 2, é dia de finados, mas, mesmo assim, senhores do Celtic, não precisavam de colocar este morto-vivo em campo.
Já vi formigas sem patas com maior sentido de coordenação do que este «zombie» escocês. Irra!